Por uma audiência Pública sobre os desmandos da Segurança da Universidade Federal do Pará
Para: Universidade Federal do Pará
NOTA DE REPÚDIO
Do que se constitui a política de segurança da Universidade Federal do Pará? Racismo, machismo e intransigência institucional!
Na noite do dia12 de novembro de 2015, aconteceu o primeiro dia do evento Rock Rio Guamá, um projeto de música elaborado por estudantes da universidade e aprovada na mesma. O evento ocorria na beira do rio Guamá, no complexo cultural do Vadião, dentro da instituição, com dois ambientes: um palco onde rolava o rock e uma tenda onde rolaria uma batalha de MCs do movimento Hip Hop. Acontece que, já na entrada da universidade, estava sendo feita desde o início do evento, a rotineira seleção etnicorracial de quem entraria ou não na universidade, ou se entrasse, por quais procedimentos teriam que passar para ter acesso ao que seria um evento público. Jovens negros e negras, caminhando, vestidos de uma maneira específica, não entrariam ou teriam que passar por “baculejo” e demais hostilidades para então usufruir do evento. Já quem estivesse de carro, com aparência aceitável aos olhos eurocêntricos embutidos na segurança da UFPA pela mente europeia e burguesa da instituição, teriam acesso ao complexo cultural com tranquilidade garantida.
Eu, mulher, negra, periférica, mãe, resolvi prestigiar o evento, junto ao meu companheiro, também negro e nossa filha. Por volta de 19h30, após passar pela “revista” na entrada da instituição, conseguimos acessar o evento. Não demorou muito para a segurança do campus chegar, com em torno de 5 guardas para pedir que tanto eu, como uma outra amiga, também negra e mãe, que já estava sendo perseguida pela segurança desde mais cedo, nos retirássemos dali, alegando que aquilo não seria espaço para estarmos com nossas filhas. Logo a organização do evento também chegou ao local, e quando achei que seriamos amparadas pelo recorte fundamental de raça e gênero diante de tudo o que estava ocorrendo, infelizmente a imaturidade e aparente falta de real compromisso com as lutas que travamos no dia a dia, fez com que fizessem coro com a hostilidade com a qual estávamos sendo tratadas e tratados. Nossos companheiros negros já estavam sendo empurrados, na tentativa baixa de nos criminalizar, com insinuações por parte da segurança de que nós estaríamos exaltados e agressivos com os guardas, quando na verdade, vídeos mostram que em nenhum momento isso ocorreu. Enquanto isso, a batalha de MCs que estava prevista, atrasava, pois os protagonistas do espaço estavam sendo barrados na portaria, um verdadeiro show de opressão e criminalização de nosso povo. Desamparadas também pela organização do evento, o coro que nos convidava a se retirar dali para não comprometer o seguimento do mesmo prevaleceu, mesmo diante de toda a injustiça e da intransigência institucional frequentemente reproduzida na figura da segurança do campus. Minha filha tem dois anos de idade, e desde a gravidez a luta pelo acesso aos variados espaços sociais me é cara, as caras feias, as reclamações, as tentativas de convencimento de que a partir do momento em que parimos, temos que permanecer dentro de nossas casas à lavar fraldas dentro de uma sociedade patriarcal, machista como a nossa, já é massacrante, o que se potencializa ao se tratar ainda de uma mulher negra mãe. Mas é inaceitável que isso seja reproduzido também, dentro de um espaço pensado por estudantes que deveriam caminhar ombro a ombro conosco, nessa luta por direitos mínimos e acesso aos espaços aos quais temos direito. Lembro que a essa altura, ainda eram por volta de 20h, os seguranças nos ameaçavam chamar o conselho tutelar, mas conscientes de nosso direito, permanecemos no espaço, apesar de eu ter pensado sim em me retirar, pois compreendo a dificuldade que é construir um evento destes e efetivá-lo, mas ao esfriar um pouco a cabeça e reafirmar meu compromisso com essa luta que nos é tão árdua, decidi permanecer ali, comprar a briga e ainda, fazer o debate com os organizadores de que isso não pode se perdurar, não podemos admitir que nossos projetos sejam cooptados por mentes opressoras como a desta instituição, a luta se dá em todos os âmbitos onde atuamos, e precisamos mais do que nunca nos fortalecer para combater não só a criminalização da juventude negra, mas o racismo que norteia esta criminalização, o machismo, a dificuldade desta instituição em aceitar que este espaço seja sim ocupado pelo povo, pelos negras e negros, e o abuso que se reflete na ação dos agentes de segurança deste espaço.
Depois de muita insistência da própria galera da batalha de MCs, ela ocorreu, depois de muito batermos pé para permanecermos no espaço, permanecemos até aproximadamente às 22h, monitorados e sob a tentativa de intimidação da segurança. Um dos organizadores do evento nos procurou um pouco depois dos ânimos se acalmarem, nos mostrou um documento enviado para a segurança e prefeitura do campus, onde estava escrito que o público do evento seria variado.
Então:
1. Chega de cairmos na malha fina burocrática, aprovar projetos na universidade , que é PÚBLICA é NOSSA, e deixar que a instituição ataque e liquide a nossa autonomia;
2. Sabemos SIM a dificuldade de realizar um evento, mas não podemos JAMAIS rifar nosso compromisso com a luta por direitos de nossas companheiras e companheiros em nome de seguir com o que está apenas contribuindo para nossa criminalização dado a maneira como está sendo conduzido o processo;
3. Chega de permitirmos os abusos por parte da dita “segurança” da Universidade Federal do Pará, que é composta por pessoas igualmente negras e oprimidas, como nós, em sua maioria, mas reproduzem há muito tempo o pensamento elitista, opressor da instituição;
4. Já passou da hora de nos organizarmos e exigirmos que sejamos respeitados pela instituição, que nosso acesso a este espaço público seja garantido, que a segurança de fato seja segurança, para todos e todas;
5. Exigimos ainda uma audiência pública para discutirmos a truculência por parte da instituição em casos como o de ontem e outros tantos relatos frequentes de ações semelhantes. Para isso convocamos a reitoria, prefeitura, segurança e demais entidades civis para construirmos um cessar a estes absurdos.